quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Poema: A dama do lotação


A DAMA DO LOTAÇÃO

Cena 1

A mulher esconde a libido
Sob o vestido
Bem comportado.
O fogo que queima
Por dentro
Vai lhe ardendo
O desejo de brasa –
A mulher sai de casa
Quando tudo está pronto

(Ela está no ponto
E espera que pare pra ela
A condução que vem ao seu encontro).

Cena 2

A cada viagem
Vagueia olhares
Cruzando ruas,
Cruzando pernas.
A mulher, entre homens,
Colada nos corpos, viaja no aperto.
Não há rumo certo,
Nem longe, nem perto.
Somente desfruta
O roçar dos quadris –
Que no balanço das curvas
Todo homem é feliz.

Cena 3

Quantos dão num lotação?
Quantos cabem numa cama?
As respostas dizem aqueles
Que acompanham essa dama.

Têm parada obrigatória
Depois que dão o sinal.
Mudanças na trajetória
Levam sempre ao ponto final.

Marcelo Asth

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Poema: Embrulho

EMBRULHO

Quando o órgão dói, tudo para
com o fisgar da célula,
pêlo por pêlo despencando pêlo,
como o caranguejo,
ares de morfina.
Embrulho do presente constante,
a iminência do sempre
ainda.

Quando o órgão corta,
multiplica massa,
sangue, líquor, soro, mabthera.
Rituximab no catéter, éter, éter,
porte, ser ou não ser Hodgkin, 
eis a questão.

Metástase extasiada
abraço baço acessório,
fístula pílula comprimido
ar que me escapa.

Marcelo Asth

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Poema: Estalos

ESTALOS


a gente cria uma coisa no cosmos,

uns estalos de telepatia coriscando tudo:

fantasia de partícula de bóson

pra recriar outros mundos.


Frida Malev

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Poema: Agosto

AGOSTO

deixei o frio da noite entrar pela janela
e o inverno levou toda a minha névoa.

Marcelo Asth

Poema: Caça

CAÇA




Lora, lura, toca, lorga,
cava, escava, escavaça, catuca,
entra, enfurna, penetra, interna, 
subsolo, terra, piso, chão.


Lagomorfos,
leporídeos,
lebres e lebrachos
- láparos herbívoros -,
o caçapo
encaçapa esconderijo,
lorca, abrigo:
fuga do sabandijo. 

Pá!


León Bloba


Poema: Espera

ESPERA

A gente é o que pode,
sempre esperando o que já está,
corroídos de longo tempo 
e embriagados de tentativas.

Ouço a memória da pele
tateada em retentivas,
no momento em que me sinto
santo, tonto, canto, tinto.

O espanto infinito
de ser todos que eu sou,
ser de todos que eu soo,
de ser eu quando si só,
quando me sonho,
sólido sonho,
solidária solidão
que me acompanha.

A gente só pode no momento que já pôde.
Todos somos
e isso nos basta todos,
Tolidos doidos
na louca esfera, 
Na cor roída embriagada.
A gente vive na espera,
na antevéspera do nada. 

León Bloba