As serpentes se afastam
Com a figa de azeviche.
Várias palavras sibilantes
Ressoam caóticas no teu beliche.
Nem tento entender de que jeito
Meu pensamento, por fetiche,
Adentra as portas do peito
De quem dorme num beliche...
Não sei por que
O que eu penso escrito
É transcrito do meu peito
De um jeito esquisito.
Meus poemas arrombam tua fresta.
Sob a porta correm versos...
Não escrevo pra este ou pra esta.
Escrevo pras paredes do universo.
Mas secretos fogem de mim,
Escolheram a ti pra roubar muito sono.
E como seu sonho, assim,
Recolhe meus versos e não sou mais dono.
Não duvida de pastiche,
Plágio ou só brincadeira.
Você põe no teu beliche
De uma forma corriqueira,
Na cama que em cima existe,
Tantos símbolos, besteiras
De feia poesia triste
De viagens altaneiras.
Já tentei por muita carta
Entrar em contato contigo.
Percebi que a porta descarta
O que não é verso do seu amigo.
Fiquei aqui, quebrei a cuca,
Pra escrever assim em verso
Uma mensagem maluca
Entre dois mundos diversos.
Não tem tanta qualidade,
Mas só assim que chego a ti.
Através das linhas tortas
Que eu já escrevi em mim.
Marcelo Asth
Foi com sobressalto, como se minha cabeça gelasse e meus pés tremessem, que li este poema na madrugada de ontem. Só por ler o título estremeci imaginando numa fração de segundo o que viria como conteúdo.
Consegui estabelecer um contato com Marcelo Asth. É como se eu, extraterrestre, fizesse uma descoberta. São dois mundos diversos, como ele diz. Mas compartilho tantas minusciosidades com ele, tantas intersecções...
Agora, a essa altura, quando não acredito mais em sonhos e explicações, tento me definir nessa relação postal-enigmática. Se viessem os versos através de pombos, eu imaginaria estar sendo alvo de chacota. Mas essa relação entrepassa as frestas que os versos rompem, noite à noite, íntimos e secretos, roçando na madeira da casa rodeada de árvores que não escutam seu silêncio.
Tenho vontade de começar a escrever poemas, anotá-los, guardá-los, mesmo que numa caixa, ou junto com os teus que recebo, sob a cama de cima.
Será que se eu escrevo, algum chega pra você, por debaixo de alguma porta sua? Ou se perde na casa de um tirolês desempregado?
É perigoso brincar com palavras. É perigoso dar teu significado através de um poema. Não é todo mundo que te entende.
Bom, agora que sei que você me escreveu cartas e nenhuma me chegou, que só vêm versos, peço pra que use mesmo as rimas ruins pra me dizer como faz no teu ritual de escrita. Você faz como? Escreve, guarda em algum lugar, acende uma vela e escreve com pena, delira na tela do computador?
Ah, eu sabia que a pedra de azeviche era ligada ao luto. E agora procurei na internet a relação da pedra com as serpentes.
Quero me comunicar mais com você. Sinto que me comunico também mais comigo.
Beijo, Bloba.
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